A Adega Malápio é uma adega familiar situada na Bairrada, conhecida pela recuperação da tradição da vinificação em talhas de barro. O projeto, liderado por Romeu Martins, produz vinhos únicos de forma ancestral. Características principais Vinho de talha: A Adega Malápio produz vinhos de curtimenta em talhas de barro centenárias, preservando um método de vinificação com raízes medievais. Localização: A adega encontra-se em Aguada de Baixo, no concelho de Águeda, no coração da região da Bairrada. A propriedade está inserida numa zona de vinhas e arrozais, perto da Pateira de Fermentelos. Enoturismo: A Adega Malápio oferece várias experiências, que incluem: Visitas guiadas às instalações e vinhas. Provas dos seus vinhos de talha. Refeições regionais, com pratos como o leitão à Bairrada ou rojões. A possibilidade de participar na vindima, apanhando uvas e provando o mosto.
Nota do Produtor e Enólogo, Romeu Martins:
O empreendedor As minhas raízes estão em Barrô, Aguada de Baixo e Aguada de Cima, aldeias do norte da Bairrada. O meu pai era mecânico e a minha mãe costureira. Como tantos portugueses humildes viram-se forçados a emigrar e eu nasci, por isso, na África do Sul. Regressei à Bairrada com dois aninhos e passei a viver com o avô Aristides, mestre do barro e encarregado geral da famosa Cerâmica do Bicarenho, que me foi ensinando os segredos da sua arte e as fainas agrícolas, principalmente o cultivo das vinhas e o fabrico do vinho. Dizem que eu tinha um espírito irrequieto e empreendedor, e talvez seja verdade pois interessava-me por imensas coisas e pela leitura, podendo considerar-me um leitor compulsivo. Tinha ânsia de saber e de fazer coisas. Aos vinte anos comprei um restaurante em Águeda, quando os bancos ofereciam dinheiro, e tive a primeira oportunidade para assumir riscos, nunca me passando pela cabeça falhar. Infelizmente, não correu bem, fruto de alguns erros que cometi e, principalmente, por a Câmara Municipal ter mandado fechar a rua do restaurante, para obras, que me fez perder muitos clientes. Tive de o vender e partir para outra. Como tinha feito 800 horas de formação em cozinha e pastelaria, na Escola de Hotelaria de Coimbra, procurei algo onde pudesse mostrar o que sabia e conhecer mundo. Por isso, fiquei feliz quando ganhei uma posição de Chef nos cruzeiros da Princess Cruise Lines. Andei por lá vários anos, corri mundo, conheci muita gente, ganhei experiência e tornei-me fluente em inglês. Quando me fartei e as saudades da terra falaram mais alto, regressei à minha querida Bairrada e resolvi tirar um curso de Topografia na Universidade de Aveiro. Logo que o terminei estabeleci-me como topógrafo, por conta própria. Trabalhava bastante, mas ao fim de algum tempo percebi que, por mais que me esforçasse, não saía da cepa torta e decidi, de novo, mudar de rumo. A exemplo dos pais, resolvi emigrar para a Dinamarca, onde pretendia trabalhar três anos e ganhar dinheiro suficiente para regressar à terra e montar novo negócio. Em vez de três anos fiquei dez e foi na Dinamarca que montei o negócio, depois de arranjar um sócio. Como gostava de pastelaria, achei que montar uma casa de empadas e pastéis de nata seria boa ideia. Desta vez o negócio deu certo e os pastéis de nata começaram a fazer furor na terra dos vikings, que faziam fila à porta da loja à espera de vez. Como o negócio ia bem, resolvemos abrir uma segunda loja. Mas sempre que ia à terra o meu filho, perguntava-me sempre por que razão ia embora ao fim de poucos dias. Não era vida e tanto ele como a mulher, pediram-me para regressar. A pandemia precipitou os acontecimentos e, de repente, regressa à terra, com algum dinheiro no bolso, cheio de ilusões e determinado a orientar a vida da família. Ia começar a minha aventura do vinho de talha na Bairrada. Pode parecer bizarro que, sendo eu especializado em pastelaria e topógrafo encartado, me decidisse a ser produtor de vinho de talha, mas tem a sua razão de ser. A ideia começou a ruminar na minha cabeça ainda na Dinamarca, quando decidi importar vinho de Portugal. Reparei, então, que não encontrava nenhum vinho palheto, parecido com o que o avô fazia e de que eu tanto gostava. Por outro lado, quando regressei o vinho de talha estava a renascer no Alentejo e quando o provei vieram-me as lágrimas aos olhos, pois tinha o sabor do vinho do avô Aristides. Foi o clique que me faltava para dar início ao novo negócio. Cheguei à conclusão que podia conciliar a arte do barro, que tanto me tinha marcado na infância, com o estilo de vinho que o avô fazia e não olhei mais para trás. Estava delineado o conceito, com a vantagem de poder prestar uma homenagem a quem me tinha criado. Empenhei-me, pois, em respeitar toda a tradição antiga, desde as vinhas de estilo medieval à adega de talhas do avô, feita com paredes de adobe. Com 50 anos de idade, cheio de experiência, sentia-me motivado para o negócio e a viver o período mais feliz da minha vida, na companhia do filho e da mulher. Arregacei as mangas e deitei mãos à obra.
As vinhas ao melhor estilo medieval Para poder recriar o “tinto clarinho” que o meu avô Aristides fazia, conhecido por “palheto” e com muita fama nas redondezas, era preciso ter vinhas parecidas com as dele, as quais, por herança, ficaram para os tios. Por isso, a primeira medida que tomei foi encontrar uma vinha à moda antiga que pudesse cultivar. Vinhas disponíveis havia muitas, pois há cada vez mais gente a abandonar a viticultura na Bairrada, mas uma vinha parecida com a do avô não foi fácil e demorei quase um ano a encontra-la. Descobri-a em Barrô, terra de vinhos com grande fama, que, como o nome sugere, é zona de terras barrentas. O senhor que tomou conta dela durante mais de 60 anos, disse-me que já era dos pais e dos avós, e que o primeiro proprietário, um advogado rico, mandou-a cavar profundamente à enxada, pelos Gafanhotos, os jornaleiros das Gafanhas, antes da plantação. Está virada para os campos de arroz do rio Cértima, a 500 m da pateira de Fermentelos, tem cerca de 1 ha e, como mandava a tradição da época, tem as mais variadas castas, brancas e tintas, todas misturadas. Mais de metade são brancas, onde sobressaem Maria Gomes, Bical, Cerceal e Rabo de Ovelha, e nas tintas reconhecem-se Tinta Pinheira, Castelão Nacional, Bastardo, Alfrocheiro, Trincadeira e algumas desconhecidas. As cepas impõem respeito, pois são quase centenárias, retorcidas, de tronco grosso, apoiadas a uma cana que serve de tutor. É, portanto, uma vinha mais parecida com as da Idade Média do que com as do século XXI, mas semelhante às do avô Aristides, pelo que estou convencido que irá dar um palheto parecido com o que ele fazia. Se dúvidas tivesse, deixei de as ter e decidi-me a recuperar a tradição vitícola bairradina de outros tempos com o objetivo de, não só recuperar os aromas e sabores dos vinhos antigos, que tantas recordações me trazem, mas também para aumentar a autoestima da gente da terra.
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